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Direto da Reitoria

UFRJ inaugura totem em homenagem a alunos e professores mortos durante a ditadura militar

Estrutura na entrada do RU Central faz parte dos esforços da Universidade por reconhecimento e reparação dos crimes ocorridos durante o regime

A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) deu mais um passo significativo para o reconhecimento e a reparação histórica dos crimes cometidos durante a ditadura civil-militar que governou o Brasil entre 1964 e 1985. Na quinta-feira, 19/12, foi inaugurado um totem, em frente ao Restaurante Universitário Edson Luís, na Cidade Universitária, em homenagem aos 25 estudantes e professores mortos e desaparecidos em decorrência das ações repressivas do Estado brasileiro.

Durante a cerimônia, que contou com a presença de familiares e militantes pela democracia, foi destacado o papel fundamental dos estudantes e professores homenageados, que sacrificaram suas vidas na luta por uma educação de qualidade e pela preservação da democracia brasileira. “Para nós, do movimento estudantil, é sempre uma honra participar de um momento de resgate da memória. Uma memória que, apesar de ser recente, constantemente tentam fazer esquecer”, afirmou Alexandre Borges, diretor do Diretório Central do Estudantes (DCE) Mário Prata, que leva o nome do estudante de Engenharia baleado por agentes da ditadura em 1971.

O coordenador-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Sintufrj), Esteban Crescente,  lembrou que a luta pela democracia também é uma luta pelo acesso ao ensino superior. “Esses aqui lutaram para que a Universidade fosse aberta, para que o povo estivesse aqui, porque o certo era  não ter muros para a entrada na Universidade… Todos que entrassem no ensino fundamental tivessem, no futuro, direito de cursar Engenharia, Medicina, Belas-Artes, tornar-se professor, melhorar, educar e avançar”, disse.

Memória

O totem foi produzido a partir de um concurso na Escola de Belas Artes (EBA). O projeto vencedor, elaborado pelas alunas Marcele Lins e Natália Rodrigues, teve a coordenação da professora Irene Peixoto. “Nós sabemos que é uma coisa singela, mas que tem um peso emblemático muito grande no sentido de tentar dar alguma memória e alguma reparação a esses estudantes e professores que agora têm o seu nome gravado aqui”, opinou a diretora da EBA, Madalena Grimaldi.

Marcele Lins e Natália Rodrigues, alunas da EBA, foram autoras do projeto do totem | Foto: Moisés Pimentel (SGCOM/UFRJ)

Ações como essa, que relembram as vítimas do regime autoritário, são importantes não somente para a memória daqueles que lutaram, mas também como instrumento de conscientização das gerações seguintes sobre a importância da defesa incondicional da democracia. “O importante é que essa luta está sendo desenvolvida pelas gerações seguintes. Essa temática da memória e verdade, justiça e reparação vai ser permanente no Brasil, e assim vão se conquistando, de pouco em pouco, as necessárias reparações”, afirmou o coordenador da Comissão da Memória e Verdade (CMV) da UFRJ, José Sérgio Lopes Leite.

“‘Eu Lembro’ é um ato presente, mas que diz respeito não apenas ao que foi vivenciado, mas às lutas que se travam no presente acerca do que foi vivido. O passado está em disputa no presente, e o desenlace dessa luta diz respeito ao que seremos no futuro”, reforçou Carlos Vainer, professor-emérito da UFRJ que foi o primeiro presidente da CMV e membro da Geração 68  – grupo formado por militantes que lutaram pela democracia entre os anos 60 e 80 e se reuniram novamente durante a pandemia de covid-19 para organizar novo ciclo de lutas contra o autoritarismo político.

“Eu tenho 43 anos, por isso eu não vivi esse momento histórico. Mas eu cresci vendo meus avós lutando por isso, falando disso. Eu cresci com as memórias. Mas a minha avó já se foi, a minha mãe já está ficando mais velha e as gerações vão passando, e as novas gerações vão esquecendo. Então este é um momento importante para que a gente possa manter essa memória viva. Eu vivi essa memória, mas talvez meu filho não tenha a mesma dimensão do que aconteceu”, comentou Sônia Moraes, sobrinha de Sônia Moraes Angel Jones, aluna do Colégio de Aplicação e da então Faculdade de Economia e Administração, expulsa da UFRJ em 1969 e assassinada em condições de tortura em 1973.

Emocionada, a jornalista Hildegard Angel lembrou que a luta pela memória dos crimes da ditadura é constante: “Sou grata não apenas pelo meu irmão ou pela minha cunhada, Sônia Moraes Angel Jones, mas pelo nome de todos que estão aqui. De todos que estão aqui presentes, ouvindo, se interessando por essa história, e nos passando a sua energia para que nós nos mantenhamos nessa vibração da denúncia”. O irmão de Hildegard, Stuart Angel, aluno de Economia da UFRJ, foi torturado e morto em 1971. A mãe deles, a estilista Zuzu Angel, foi assassinada também por agentes da ditadura cinco anos depois, justamente por denunciar o assassinato do filho.

Reitor leu o nome dos homenageados, que foram saudados pelo público | Foto: Moisés Pimentel (SGCOM/UFRJ)

Ações

Nos últimos dez anos a UFRJ ampliou as ações de memória e reconhecimento dos efeitos da ditadura no seu corpo social. Em 2013 foi criada a Comissão da Memória e Verdade (CMV), que atuou diretamente na pesquisa e divulgação de detalhes dos acontecimentos do período. Entre as ações empreendidas desde então está, por exemplo, a revogação, em 2015, do doutorado honoris causa do ditador Emílio Garrastazu Médici, que governou o país de 1969 a 1974, período mais duro da ditadura.

Em agosto deste ano, foi realizado pela Universidade, em parceria com a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), o evento Lembrar Para Não Esquecer: 60 Anos, que prestou homenagem aos estudantes e alunos mortos durante o período. Em outubro, foi reeditado o caderno com biografia e contexto de perseguição política do grupo, que agora é homenageado com o totem.

O reitor da UFRJ, Roberto Medronho, encerrou a cerimônia com a leitura dos nomes dos 25 estudantes e professores homenageados, que foram saudados pelo público com a palavra “presente” em um momento de profunda emoção e reverência.

Reitor Roberto Medronho lê os nomes dos estudantes e professores mortos durante a ditadura | Vídeo: Vitor Ramos